Andreas Kisser fala sobre o que aprendeu com morte de Patrícia e como isso terá influência em novo disco do Sepultura
Andreas Kisser conversou com a Sense Music Media, onde ele falou o que aprendeu com a experiência da perda de sua esposa, Patrícia Kisser, no ano passado, vítima de um câncer de colon. Ele diz:
“Me ensinou tudo sobre a vida. Foi uma experiência tão grande que comecei um movimento logo depois que ela faleceu. Porque tudo o que aconteceu, todo o processo, câncer, ela estava realmente indo muito devagar e todos os cuidados paliativos que vieram, a morfina e todas essas coisas, as conversas com o hospital, com os médicos, aprendi muito durante aquela semana ou duas semanas, dos últimos dias que senti tão despreparado como cidadão brasileiro para lidar com essa situação. Não só porque não falamos sobre morrer, mas porque todas as coisas burocráticas que não somos estimulados a aprender e a conversar com a nossa família, basicamente para falar sobre morrer, falar sobre eutanásia, falar sobre suicídio assistido, falar sobre o testamento ou tudo que tem a ver com a morte, o funeral, se você tem seguro, se você não tem seguro, quanto você vai pagar de imposto e tudo mais. E eu comecei esse movimento porque quero estimular as pessoas aqui no Brasil a falarem sobre a morte com seus entes queridos, com sua família, com seus filhos, com seus pais, com seus amigos, porque Patricia, ela falava sobre morrer de uma forma muito caminho natural. Desde que nos conhecemos, ela fala: ‘Quando eu morrer, não me coloque no caixão sem travesseiro, sem cobertor, sem pijama. Não quero ficar com frio e coisas assim. E todos nós rimos. Quando isso aconteceu, todos nós sabíamos o que ela queria. Então eu percebi que era tão reconfortante, tão caloroso realizar ali o desejo das pessoas que você mais ama que percebi que precisamos conversar sobre morrer. É a forma de nos sentirmos mais tranquilos, de nos sentirmos mais vivos, inclusive de aceitar a finitude, de aceitar o fim, e não tentar evitar a conversa ou pensar que isso não vai acontecer conosco.
Todos nós vamos morrer, então por que não conversamos sobre isso, para nos prepararmos melhor, para nos conhecermos melhor, porque você vai aprender sobre sua família. você vai aprender sobre você, você vai levantar questões sobre você, você vai querer conversar com um médico, com um advogado, com sua mãe ou com seu filho sobre isso. E você vai aumentar a conscientização e você vai ficar mais unido com a sua família. Passei por isso com a Patrícia , com meus filhos, com meu pai e minha sogra, com meu cunhado e tal, e estamos mais unidos do que nunca. E sinto a vida é muito mais intensa porque respeito a morte. Respeito o morrer. É o nosso maior professor. Devemos aprender com isso. Não devemos ter medo de morrer. Morrer não é um castigo. Morrer é um fato da vida. Todos nós sabemos disso. … Vamos respeitar isso. A partir do momento em que respeitamos isso, passamos a viver o cotidiano, o presente, com mais intensidade. Você não vai esperar até amanhã para fazer certas coisas, para dizer ‘eu te amo’ para quem você ama. Você não vai esperar para realizar um sonho ou fazer uma viagem ou aprender violão, se for o seu sonho, ou algo assim.
Então foi isso que aprendi. Conheci pessoas incríveis que querem estimular, assim como eu, a sociedade brasileira a falar sobre isso, porque é possível prepararmos melhor o nosso coração, a nossa alma e o nosso intelecto para lidar com a parte burocrática do momento estamos mais frágeis emocionalmente. Então por que não se preparar, durante a vida, desde que você nasceu, para falar sobre morrer, porque todos nós vamos morrer. Não entendo por que as pessoas têm tanto medo de falar sobre morrer. Entendo que não é fácil, mas é fundamental e totalmente necessário para nós, não só no Brasil, mas para todos nós. Vemos em diferentes culturas ao redor do mundo que lidam com a morte de maneiras muito diferentes, especialmente no México , por exemplo – eles comemoram, fazem uma grande festa, porque respeitam a morte. Não é uma escolha nossa. Não é uma escolha. Então, vamos conviver com isso. Vamos conviver com a morte, e aí a gente pode lidar com isso de uma forma muito mais pacífica. Então isso é algo que eu comecei aqui no Brasil, e está crescendo lentamente, mas estamos começando a reunir algumas pessoas muito legais que estão começando a estimular realmente, pelo menos a conversa, a discussão para que a gente podemos avançar no assunto.”´
Andreas foi perguntado se a perda da companheira irá ter alguma influência no próximo disco do Sepultura. Ele responde:
“Claro. É inevitável. É uma experiência de vida. E eu mudei muito, porque um grande parte de mim morreu com minha esposa, e outras partes de mim estão começando a acordar, porque tenho novas experiências, um novo futuro, algo que não planejei. Tenho uma ideia totalmente diferente do meu futuro. Envelhecer com ela, ter netos e tal – tanto faz. Mas não vai ser assim, então vou aceitar o presente que eu tenho e vou conviver com os elementos que tenho e ficar muito grato, muito grato por ter a Patrícia há 32 anos na minha vida, que construímos uma família que tínhamos. Tenho três filhos incríveis. Além de todas as coisas que aprendi com ela, nunca vou esquecer, e então sigo em frente, para construir e crescer a partir de essa experiência e não ser — sei lá — ser ingrato ou com ódio ou não aceitar uma situação, porque esse não é o caminho. Quer dizer, não depende de mim nem de ninguém. Nós vamos morrer. É um fato da vida para tudo. Não só nós – plantas, animais, tudo. Então, qual é o sentido de tentar negar isso?”