Andreas Kisser fala sobre conceitos de morte e diz: “A morte não é punição, é educação e limite”
O Sepultura está rodando o Brasil com a sua turnê de despedida, que recebeu o nome de “Celebrating Life Through Death”. Andreas Kisser vem abordado bastante o assunto morte desde a perda de sua esposa, Patrícia, em 2022, vítima de um câncer de colon.
Ele conversou com o site Noize, onde ele foi abordado sobre a relação do nome da tour e suas experiências com a morte. Ele diz:
“Na verdade, a celebração da vida através da morte é o que a vida é, né? Se você for definir a vida, é isso: celebrar o que a gente tem até morrermos. Obviamente, foi um decisão influenciada pela minha experiência com a minha esposa, a Patrícia, que faleceu de câncer há dois anos. Eu passei por essa experiência e coloquei para fora, falei abertamente do que aconteceu, da minha indignação com tudoque tava acontecendo, do meu despreparo como cidadão brasileiro em lidar com uma situação como essa. Não se fala em eutanásia, suicídio assistido, testamento vital, basicamente, não se fala de morte no país. Eu percebi que isso é um buraco gigantesco na sociedade brasileira, algo que todo mundo ignora. Tem muita gente falando e escrevendo, obviamente, que eu acabei conhecendo depois por conta desse processo.”
Quando perguntado quais projetos ele desenvolveu após passar por tudo isso, ele diz:
“Comecei a expor isso: criei o movimento Maetricia, justamente para estimular o assunto “morte”, para estimular as pessoas a conversarem com os familiares e com as crianças. A gente tem que ser educado sobre a morte desde que a gente nasce porque ela é um fato! E você vai ter que lidar com inventário, com o funeral,com os parentes, com um monte de coisas que a gente deixa para depois. Quando acontece, é uma avalanche emocional. Então, eu percebi que dá para se preparar melhor para isso, porque minha esposa, a Patrícia, era uma pessoa que sempre falava de morte de uma maneira muito leve, muito tranquila desde que a gente namorava. Ela falava “pô, quando morrer não vai esquecer de botar meu travesseiro, meu cobertor, meia no meu pé, porque não quero ficar com friol”. A gente dava risada, mas quando ela faleceu, todo mundo sabia o que ela queria. Foi a coisa mais linda para quem fica fazer o desejo. Por exemplo, o funeral do Zé Celso Martinez, do Teatro Oficina, foi a coisa mais linda do mundo. Aquilo que eu queria para mim, aquilo que eu queria para todo mundo! Celebrar a vida, ser agradecido. A morte não é punição, ela é educação, é limite. Um filme que não tem fim não tem sentido. O fim é tudo, é sentido, é conclusão. O fim é atendimento, é aceitação. Criei também o Patfest, que arrecada fundos para a Favela Compassiva, que leva o cuidado paliativo para as favelas do Rio de Janeiro e de Minas Gerais, para pessoas. A morte ensina, é uma professora, e me estimulou muito a não ficar jogado na minha casa com pena de mim mesmo. Então, esse é o meu luto, é o meu processo de luto, da minha família: se juntar e estimular as pessoas a se prepararem melhor porque é possível. E essa turnê do Sepultura tem muito a ver com isso.”
Andreas foi perguntado sobre o que ele espera deixar como legado do Sepultura, e ele responde:
“O Sepultura não vai acabar nunca! OLed Zeppelinacabou em 1980 e ainda é a banda que mais vende discos até hoje. Eu acho que a turnê e discos novos é uma parte do que é uma banda. O Sepultura tem vários produtos, tem documentário, tem várias coisas que vão ficar. A gente vai fazer uma exposição com tudo que a gente tem da nossa história. Nós temos um arquivo fantástico de tudo que saiu na imprensa, posters de turnês, camisetas de merchandise, instrumentos… A nossa vontade é organizar isso ao término da tour, fazer essa exposição que possa viajar o mundo. O futuro vem de acordo com o que a gente faz com o presente, é a consequência do hoje. Então, a gente tá vivendo muito o hoje, celebrando o hoje. E o que vier a acontecer, vamos lidar na hora que tiver que lidar.“
O Sepultura continua sua turnê de despedida pelo Brasil.