Primal Fear traz o power metal alemão oldschool ao seu fiel público em SP
Fotos: Eddie Junior
O Primal Fear é uma daquelas bandas que, apesar do altíssimo nível técnico e extensa discografia, sendo 14 discos em pouco mais de 20 anos de carreira, parece não conseguir surfar na popularidade atingida por outras colegas do gênero. Isso fica nítido ao observar o público que os acompanha – um seleto grupo de pessoas mais velhas que se empenham em conhecer tudo que tenha sido derivado dos pioneiros, como o Helloween.
A banda alemã, que demorou a confirmar datas para o Brasil e teve algumas apresentações canceladas (Rio de Janeiro e Maranhão) conseguiu concluir sua passagem pelo país com 5 shows, sendo 3 cidades no estado de SP e também em Curitiba e Brasília, para daí seguir rumo à vizinhança latino-americana. A capital paulista sediou o encerramento dessa leg da turnê, na Fabrique Club, no último domingo, 29, com lotação de pouco mais de ⅓ de sua capacidade e fãs que transitavam tranquilamente entre o bar e a pista.
Pontualmente às 19:30h, após os testes do telão de plano de fundo e da fumaça de gelo seco, o baterista Michael Ehré (Gamma Ray) assume sua posição, seguido pelos guitarristas Tom Naumann & Alex Beyrodt e baixista Alex Jansen (Between Worlds), para iniciar o show com a pedrada clássica Chainbreaker, de seu album de estreia (Primal Fear, 1998). O carismático vocalista Ralf Scheepers é o último a aparecer, sendo imediatamente ovacionado pela plateia. Um salto no tempo até 2015 resgata Rollercoaster, uma canção que mistura bem power riffs com um refrão pegajoso e radiofônico em que a plateia canta junto o “Burn, burn, burn!” a comando de Ralf. Alex nitidamente se diverte muito e a todo tempo incentiva os fãs a pularem e baterem palmas para acompanhar a base da música.
Ralf diz que é muito bom estar de volta a São Paulo, agradece o apoio (em português mesmo) e reconhece a dificuldade que tem sido para os fãs darem conta de tantos shows e festivais que vem acontecendo no segundo semestre desse ano. Fala um pouco sobre o novo album, Code Red, lançado há apenas 2 meses, e antes de mandarem a primeira faixa dele escolhida para o set, The World is on Fire – que lembra bastante a pegada do Judas Priest de 2010 pra frente, banda da qual Ralf já teve um projeto tributo –, fazem uma intro de “We Will Rock You” (do Queen), com a galera acompanhando nas palmas e cantando “Pri-mal Fear” no ritmo das batidas do bumbo.
Emendam com Deep in The Night, que tem boa recepção do público; e mesclam uma das antigas, Face the Emptiness, de 2007, para dar uma balanceada nos sons menos conhecidos. Ao final da música, Ralf parece ter notado uma fã em especial que estava bastante animada junto ao palco e a chama de “tchutchuca”, arrancando risadas gerais – com exceção de seu acompanhante, o que Ralf percebe e comenta logo em seguida: “Poxa, ela é sua namorada, cara? Me desculpe”. Após se recomporem, mandam a última faixa selecionada do novo album, Another Hero, com seus riffs bem old-school e dobradinhas de guitarra em harmonia, com refrão um pouco arrastado, que deu uma amornada na galera, apesar de Alex e Tom puxarem uma “ola” e palmas em diversos momentos. Os ânimos logo voltaram a se inflamar com as chamas de Nuclear Fire, do álbum homônimo de 2001, em que o destaque é a bateria veloz e marcada por várias viradas e uso de pratos. Os músicos conseguem ainda fazer a plateia ‘cantar’ a melodia de guitarras do riff principal, um fenômeno comum entre fãs do estilo power metal.
Na sequência, a banda optou por colocar Hear Me Calling, faixa de seu álbum Metal Commando, de 2020. “Vocês estão aí? Tudo bem aí?”, pergunta Ralf, a após a calorosa resposta da plateia, o vocalista pediu para que cantassem juntos para celebrar esse álbum, já que não foi possível fazer turnê devido à pandemia global de COVID. Sempre muito simpático, diz que deseja a todos um excelente “domingo na balada”.
O ponto alto da noite certamente veio logo após, com a bela power ballad Fighting the Darkness, do album New Religion (2007): fomos agraciados com uma impecável execução dos vocais limpos e agudos de Ralf, e ainda uma performance em versão estendida, na qual os virtuosos solos de guitarra impressionam até mesmo visualmente, dado o contraste do instrumento canhoto de Tom com o ‘regular’ de Alex. Os fãs interagiram bastante, com as mãos para o alto balançando lentamente ao ritmo do refrão. Ao final da canção, Ralf aproveita esta participação para brincar com a galera fazendo vocalizações praticamente impossíveis e querendo que todos o imitassem. O cantor de 58 anos exibe alcance, potência e afinação invejáveis, ainda que em pequenos momentos do show tenha se deixado levar e dado umas escorregadas – nada que diminua a qualidade da performance.
O ‘treino vocal’ da plateia aqueceu os motores para a intro da cadenciada King of Madness, do album Apocalypse (2018); e na sequência, a porrada The End Is Near, do Rulebreaker (2016), que fez todo mundo bater cabeça. Talvez até Michael tenha se empolgado demais, pois ao término da música, uma breve pausa foi forçada para manutenção na bateria. Nesse momento, um falante Ralf dá a entender que parte de sua alegria nesse dia vem das caipirinhas, mas o músico faz questão de reforçar que o álcool não é necessário para que alguém possa se divertir. Resolvido o problema na bateria, Michael dá início a When Death Comes Knocking, de Delivering the Black (2014), que conta com diversas passagens marcantes de guitarra, executadas com maestria por Alex.
Chegando ao final do set, Ralf faz mais uma vez questão de apresentar seus colegas de banda e não poupa elogios a Alex Jansen: “Não apenas um excelente baixista, mas também um grande ser humano, sem o qual, não seria possível realizar a turnê”. O músico foi encarregado de substituir ninguém mais ninguém menos que o membro fundador Mat Sinner, que passa por sérios problemas de saúde que o afastaram dos palcos. E falando em origens, a banda retoma o fôlego para mandar as enérgicas Final Embrace, de Jaws of Death (1999), e, claro, Metal is Forever, um hino da banda desde seu lançamento em 2004 (Devil’s Ground), cantado a plenos pulmões pelos presentes.
Os alemães então agradecem e se retiram do palco, mas as luzes da casa, que continuam apagadas, são o sinal de que ainda não é o fim – e o setlist tem se mantido o mesmo em todos os shows, então os mais antenados também já sabiam o que estava por vir. Corroborando que o show só acaba quando termina, os músicos retornam e lançam um trechinho instrumental de “Another Thing Coming”, do Judas Priest, antes do petardo Angel in Black. E para encerrar, de volta aonde tudo começou – Running in the Dust
É realmente uma pena que, por algum motivo, a banda não tenha cativado muitos jovens por aqui. O show, que fez um apanhado de quase toda a carreira, teria sido excelente oportunidade para se aprofundar mais e garantir que, a cada lançamento, os músicos sempre tenham datas agendadas para o país – afinal, ficou claro que eles ainda possuem muita energia para manter o ritmo quase incessante de composições e turnês.