Rafael Bittencourt porque o Angra não fez tanto sucesso no Brasil
Ainda que o Angra seja provavelmente a maior banda de heavy metal do Brasil junto com o Sepultura, no país, eles nunca alcançaram o sucesso dos seus parceiros, e Rafael Bittencourt falou sobre o porque disso. Ele diz, conforme transcrito pelo Confere Rock:
“Meu pai acompanhou também — já falecido — ele viu tudo acontecer, mas no começo demorou pro Angra ser conhecido aqui no Brasil. No Japão, por outro lado, a banda já era respeitada e reconhecida. Eu mostrava revistas pro meu pai e ele dizia: “Isso aí tu imprimiu, né?”. Eu ainda morava com os meus pais e, naquela época, sucesso, pra eles, era estar no Faustão, num programa de auditório. Eu tentava explicar que não era bem assim, que as escolhas de estilo que eu fiz eram justamente pra evitar isso. E não ia rolar. Mesmo assim, a gente chegou a ir no Jô Soares, o que foi legal.
Lucas vocalista do Fresno, que estava na conversa, disse então:
“Naquele tempo, várias bandas do metal nacional tentaram movimentos pra se tornarem mais acessíveis — cantar em português ou fazer um som mais pop — mas, no fim das contas, não virou muito pra ninguém. O metal, especialmente o tipo que a gente fazia, nunca foi pensado pra ser algo “palpável” pro grande público. É distante mesmo, exige muito mais. Não é só uma mixagenzinha diferente.”
Rafael então continua:
“O metal tem essa característica: quando uma banda é conhecida dentro de um segmento específico — doom, death, black — ela acaba sendo reconhecida em todos os lugares onde aquele som tem força. Se espalha rápido. Sempre foi assim. O black metal, por exemplo, que começou na Noruega com aquela história toda de queimar igreja, hoje é bem mais organizado. Várias bandas vieram pro Brasil e encontraram público fiel por aqui. Sim, o Brasil tem muito público pra metal. É só ver a quantidade de bandas que surgem e quantos shows de metal lotam estádios por aqui.
Só que a realidade das bandas brasileiras é outra. Elas nem miram grana. Sabem que isso é algo distante. Muitos músicos acabam dando aula pra manter o trampo, ou até têm banda só pra gastar uma grana mesmo. O foco é o prestígio, não o retorno financeiro. E, sinceramente, se a gente cantasse em inglês, dificilmente teríamos a visibilidade que temos hoje.
Sempre torci pra que houvesse uma cena forte de rock pesado cantado em português. Quando surgiu o Raimundos, por exemplo, foi a primeira banda pesada em português que realmente me marcou. Claro, antes já tinha o Golpe de Estado e várias outras do underground — como Vulcano, Santuário, Salário Mínimo — mas eram todas mais obscuras. O rock nacional, até então, era muito mais pop do que rock mesmo. Não tinha aquela guitarra suja, pesada. Aí vieram Planet Hemp, Raimundos, CPM 22, e a cena começou a mudar. Passou a refletir melhor o que tava rolando lá fora, principalmente nos EUA.”
Na sequência, Rafael explica a dinâmica do estilo que o Angra toca e as dificuldades que isso traz para logísticas:
Mas aí entra a grande questão: como passar verdade sendo de um país sul-americano, de terceiro mundo, quando o heavy metal tem uma estética glamourosa, épica? A gente precisa pagar caro pra montar estrutura, sem lugar decente pra tocar, sem som bom, sem apoio. Cada cenário é montado com muito esforço.
É por isso que o metal extremo acaba sendo mais viável no Brasil. Ele é mais cru, mais direto. E hoje somos um dos maiores produtores de bandas de metal extremo do mundo. Olha o Krisiun, a Crypta… são bandas com uma estética thrash mais do início mesmo. O própriO Sepultura, com o Roots, trouxe uma estética de lama, de floresta, de Amazônia. Aquilo sim era verdade, sem precisar do glamour.
O trecho pode ser conferido abaixo.
Acho que o metal cantando em português soa melhor no som extremo ou mais sujo. No Metal melódico cantar em português, fica parecendo que vc está cantando música gospel. De qualquer modo, se vc tem uma banda brasileira de metal tem que ir para fora mesmo. No Brasil o que predomina mesmo é o fator modismo, as músicas que já conhecemos e carnaval. Abraços!