Resenha: Scour – “Gold” (2025)
Com o lançamento de “Gold”, o supergrupo americano Scour reafirma sua ambição dentro do metal extremo ao oferecer um híbrido feroz e tecnicamente apurado de black metal moderno. Sob a liderança do icônico Philip H. Anselmo (Pantera, Down, Superjoint), a banda entrega seu primeiro álbum completo com uma força avassaladora que imediatamente o coloca entre os principais candidatos a melhor lançamento do ano — não só no black metal, mas no metal extremo como um todo. O disco chega ao público pela aliança entre a Nuclear Blast e a Shinigami Records, dando o peso e a distribuição que um trabalho deste calibre merece.
Gravado entre 2023 e 2024, “Gold” tem produção de Dennis Israel e masterização de Jens Bogren, o que garante um som cristalino, poderoso e com todas as nuances técnicas em evidência — um contraste direto com a estética lo-fi que ainda domina boa parte do underground black metal. O resultado é um disco que pulsa com intensidade, mas sem perder a clareza e o impacto de cada instrumento.
Não se pode ignorar o “elefante na sala”: Scour mergulha de cabeça na sonoridade escandinava, ecoando os ventos gelados de Darkthrone e Immortal com impressionante fidelidade. Faixas como “Blades”, “Coin” e “Evil” são exemplos de como os guitarristas Mark Kloeppel (Misery Index, Cast The Stone) e Derek Engemann (The Illegals, ex-Cattle Decapitation) reproduzem com habilidade cirúrgica o tremolo picking gélido que marcou o início dos anos 90 na Noruega. O problema — ou talvez a grande questão — é que essa reverência estilística quase suprime a identidade americana da banda, resultando em momentos tão próximos de seus ídolos nórdicos que flertam com o pastiche.
Contudo, “Gold” vai além da mera homenagem. A força real do disco está na espinha dorsal rítmica formada pelos irmãos John e Adam Jarvis, verdadeiros veteranos da pancadaria sonora. O baixo demolidor de John e a bateria milimétrica e brutal de Adam fornecem a base perfeita para a fusão de black, death e grindcore que aparece em momentos inspiradíssimos do disco. Em “Infusorium”, por exemplo, a banda transcende a emulação e atinge uma identidade própria, misturando a fúria do grind com atmosferas soturnas e melancólicas, num contraste que mostra o que Scour realmente é capaz de fazer quando ousa.
Esse tipo de ousadia, no entanto, é usada com parcimônia. Mesmo com a participação especial de Gary Holt (Slayer, Exodus), que adiciona mais peso e pedigree ao projeto, o álbum por vezes parece se refugiar demais na segurança do tradicionalismo. Em vez de explorar ainda mais os elementos dissonantes, melódicos ou experimentais que insinuam durante o disco, a banda opta por manter a marcha dentro dos limites bem estabelecidos do gênero.
Ainda assim, “Gold” é um trabalho poderoso e brutal, que cumpre o que promete: um manifesto de black metal moderno feito com técnica, paixão e reverência. Mesmo com sua clara dívida estética com a velha guarda escandinava, o disco carrega momentos de brilho próprio que poderiam — e talvez deveriam — ter sido mais explorados. Scour prova que tem talento e peso para liderar uma nova vertente do black metal americano, desde que se permita sair um pouco mais das sombras de seus ídolos.
No final das contas, “Gold” é um marco na discografia do grupo e um disco que, apesar das limitações autoimpostas, deve figurar entre os grandes lançamentos extremos do ano. Se o próximo passo for mais ousado, o topo pode estar mais próximo do que imaginam.