Silverchair: 27 anos de “Freak Show”
Em 4 de fevereiro de 1997, o Silverchair lançava “Freak Show“, o segundo álbum deste trio australiano que fez história e que é a bola da vez do nosso bate-papo por aqui neste domingo pré-carnavalesco. Vamos contar um pouco da história deste belo álbum.
Após a grande repercussão principalmente nos Estados Unidos com o álbum de estreia, “Frogstomp“, que rendeu a banda shows nos quatro cantos do mundo, o Brasil incluído. O trio passou por essas terras e foi uma das atrações do extinto Close Up Festival, que teve como headliner o Sex Pistols, que na ocasião fazia uma turnê de reunião onde os integrantes sem o menor pudor afirmavam que estavam de volta apenas por dinheiro. Detalhe é que estes três jovens se dividiam entre os estudos e as turnês.
Entre maio e novembro de 1996, o trio se trancafiou no “Festival Studios”, localizado na cidade de Pyrmont, no estado de Nova Gales do Sul, na Austrália e sob a batuta do produtor Nick Launary, conhecido por ter trabalhado com o Midnight Oil. Algumas músicas foram gravadas, mas acabaram ficando de fora do álbum, como por exemplo as canções “Punk Rock Song 2” e “Punk Rock Song 3“. A primeira, foi lançada como lado B do single “Freak” e a segunda foi renomeada e lançada como “Satin Sheets“, no álbum posterior, “Neon Ballroom” (1999). Uma outra canção, “Slime“, também foi gravada, mas jamais lançada.
O caro leitor deve estar se perguntando, se existem as canções “Punk Rock Song 2 e 3“, por onde está a “Punk Rock Song 1“? E nós lhe daremos a resposta: esse é o título original da música “Lie to me“. Outras duas canções tiveram seus títulos também alterados, são elas “The Closing” e “The Door“, que se chamavam “Cat and Mouse” e “The Proxy Song“, respectivamente.
Algumas das músicas presentes no aniversariante do dia também já eram conhecidas do público: “Slave“, “Freak“, “No Association” e “Nobody Came” eram executadas nas apresentações da banda há pelo menos dois anos antes do lançamento de “Freak Show“. O álbum ficou pronto no segundo semestre de 1996, mas acabou tendo seu lançamento adiado para o início de 1997 para não ter que concorrer com “No Code“, o quarto álbum do Pearl Jam, lançado em agosto de 1996. Entretanto, em novembro de 1996, foi lançado um box contendo os singles “Freak“, “Abuse me“, “Cemetery” e “The Door“, além de um CD bônus com entrevista da banda. Tudo para aumentar a ansiedade pelo vindouro álbum.
O vocalista/ guitarrista Daniel Johns declarou que o título do álbum era uma comparação da banda com um parque de diversões itinerante, em inglês, traveling carnival. A capa traz uma ilustração do rosto de Grady Styles Jr., um performer de Freak Show. Ele sofria de ectrodactilia hereditária, uma deformidade congênita em que o indivíduo tem os dedos das mãos e dos pés fundidos e suas extremidades são como garras. Grady era conhecido como lobster boy (garoto lagosta) e foi assassinado em 1992, pela esposa e o enteado. O sujeito não era nada agradável e havia assassinado a tiros o noivo de sua filha mais velha, na véspera do casamento, no ano de 1978. Quem vê o rosto fofinho do garoto na capa, não imagina o quão problemático ele era. A imagem é uma cortesia do World Museum Circus, localizado no estado do Wisconsin, nos Estados Unidos.
As letras de “Freak Show” falam sobre temas emocionais e cheios de angústia, como doenças e suicídio, que pareciam estar focadas na raiva e nas reações que as expectativas do álbum de estreia trouxeram para a banda. Bem, chega de delongas e vamos colocar a bolacha para rolar e destrinchar cada uma das treze faixas contidas aqui.
O disco começa com duas pedradas. “Slave” traz um Silverchair pesado como nunca havia sido visto e o grande hit da banda, “Freak“, que tocou nas rádios e na MTV à exaustão. A banda exalava peso e rebeldia adolescente e muita banda de Heavy Metal não tinha o peso que aqueles quatro guris estavam demonstrando neste início fulminante.
“Abuse me” é uma balada que ganha um certo peso no refrão e essa também tocou nas rádios. É uma música interessante. Na seguida, temos a curta e grossa “Lie to me“, onde a banda soa como o Nirvana, porém, com mais peso e mais técnica, já que à exceção de Dave Grohl, a banda de Kurt Cobain não era exatamente virtuosa. A música aqui é muito boa.
Em “No Association“, a banda tira vertiginosamente o pé do acelerador, apostando em uma música mais cadenciada e com muito peso, muito boa também. Já na faixa de número seis, “Cemetery“, a banda retorna com uma balada e incluindo elementos sinfônicos, o que deixou a música ainda mais agradável de se escutar. “The Door” traz uma pegada mais setentista e o peso não é deixado de lado e quem muito colabora para o peso aqui é o baixista Chris Joannou.
A seguir, temos uma música que daria pistas sobre os novos rumos que o Silverchair tomaria a partir de “Neon Balroom”, o disco subsequente. “Pop Song for us Rejects“, uma música que embora se torne densa e pesada no refrão, tem forte apelo mais comercial e radiofônico. Ela não é ruim, ao contrário, é bem agradável. “Learn to Hate” é outra música que merece destaque pela sua diferente dinâmica entre estrofe e refrão. Na primeira parte é até mesmo melódica, se tornando pesada no refrão, tendo Daniel Johns imprimindo mais raiva no seu vocal.
“Petrol & Chlorine” quebra o andamento do álbum que vinha muito bem. Uma música bem calma, que tem elementos de música indiana. Normalmente eu costumo pular essa faixa, pois é bem chatinha e a que vem a seguir é um petardo, “Roses“, que coloca as coisas de volta aos seus lugares, com uma música pesada e mais arrastada, trazendo um pouco da influência do Black Sabbath que eles carregavam consigo. É um dos ótimos momentos do play.
“Nobody Came” apesar de pesada e de ganhar contornos épicos no seu final, é uma música bem medonha e com seus mais de seis minutos quase provoca um anti-climax no álbum. Felizmente temos a ótima “The Closing” que fecha o álbum de forma bem honesta com seu post-grunge.
São 48 minutos que passam de maneira avassaladora e mostram uma banda ainda melhor do que já era no álbum de estreia. Ainda que Daniel Johns tenha um certo desdém pela sua obra, quando afirmou que o disco era como “algum tipo de esqueleto sombrio de uma banda de colégio guardado no armário da própria banda”. “Freak Show” é um disco ótimo e envelhece bem, pode ser uma bela influência para os adolescentes de hoje.
O músico australiano Kevin Parker, da banda Tame Impala, falou certa vez sobre a importância que este disco tem em sua vida. Aspas para ele:
“Eu entrei nesse álbum porque meus irmãos gostavam dele, eles ouviam muito grunge. Naquela época, eu tinha 10 ou 11 anos, tudo sobre descobrir o rock e perceber o quão foda ele era. Meu irmão tinha uma bateria e eu comecei a aprender a tocar. Na verdade, comecei a tocar bateria antes de ter a ambição de estar em uma banda, mas assim que me apaixonei pelo grunge, era tudo o que queria fazer. O grunge me deu um senso de identidade e eu me lembro de realmente me associar com o Silverchair, que eram esses adolescentes australianos tranquilos. O fato de serem adolescentes foi um grande problema para mim. Era como: Oh cara, você não precisa ter 30 anos para fazer isso.”
“Freak Show” foi certificado com Disco de Ouro nos Estados Unidos, Platina no Canadá e 3 vezes Platina na Austrália. Nos charts, ficou em 1° na Austrália, 2° no Canadá, 8° na Nova Zelândia, 12° na “Billboard 200”, 20° na França; 22° na Áustria, 28° na Finlândia, 29° na Noruega, 30° nos Países Baixos, 38° no Reino Unido, 41° na Bélgica, 42° na Alemanha, 43° na Suíça, 53° na Suécia e ocupa um lugar especial no coração deste redator que vos escreve, que na época era um adolescente, tal como estes três prodígios que já faziam o planeta tremer com seu som.
Este álbum encerra um ciclo, pois depois a banda acabou amaciando seu som nos álbuns seguintes, se distanciando da revolta pós-grunge. Mas o legado da banda está aí. Hoje o Silverchair não está mais em atividade, cada músico segue sua vida, mas a obra está aí e deve ser celebrada. Ouça-o no volume máximo.
Freak Show – Silverchair
Data de lançamento – 04/02/1997
Gravadora – Epic
Faixas:
01 – Slave
02 – Freak
03 – Abuse me
04 – Lie to me
05 – No Association
06 – Cemetery
07 – The Door
08 – Pop Song for us Rejects
09 – Learn to Hate
10 – Petrol & Chlorine
11 – Roses
12 – Nobody Came
13 – The Closing
Formação:
Daniel Johns – vocal/ guitarra
Chris Johannou – baixo
Ben Gilles – bateria
Participações especiais:
Jane Scarpatoni – violoncelo em “Cemetery”
Margaret Lindsay – violoncelo em “Petrol & Chlorine”
Amanda Brown – violino em “Pop Song for us Rejects”
Ian Cooper – violino em “Pop Song for us Rejects”
Todd Reynolds – violino em “Cemetery”
Lorenza Ponce – violino em “Cemetery”
Elizabeth Knowles – violino em “Cemetery”
David Mansfield – violino em “Cemetery”
Ravi Kutilak – violino em “Petrol & Chlorine”
Matthew Pierce – viola em “Cemetery”
Alan Parry – viola em “Cemetery”
Rudi Crivici – viola em “Petrol & Chlorine”
Pandit Ran Chander Suman – tambura e tabla em “Petrol & Chlorine”
Ruk Mali – cítara em “Petrol & Chlorine”