Titãs: 31 anos do pesado álbum “Titanomaquia”
Há 31 anos, em 10 de julho de 1993, o Titãs lançava “Titanomaquia“, considerado por muitos o melhor e mais pesado álbum da carreira da banda, mas que foi completamente ignorado nos recentes shows que a banda fez para celebrar seus 40 anos de existência. Mas nós iremos prestar o devido tributo e te contar um pouco daquele álbum.
Pela primeira vez na história o Titãs deixava de contar com Arnaldo Antunes em sua formação, o que não quer dizer que ele não tenha participado do processo de composição do álbum. Ele ajudou a escrever algumas músicas do aniversariante do dia. Mas ele estava querendo se aventurar em outras experiências musicais e o Rock já não era sua prioridade. Hoje ele énum dos maiores compositores da música popular brasileira e tem sua carreira solo bastante consolidada.
A banda vinha de um disco onde as críticas foram negativas: “Tudo ao Mesmo Tempo Agora”, que já tinha um certo peso. Então a banda resolveu inovar: trouxe o produtor estadunidense Jack Endino, que havia produzido o álbum de estréia do Nirvana, “Bleach“. Com a palavra, o próprio Jack:
“Achei estranho (ser convidado para produzir) para mim a princípio, porque a “Warner” me enviou primeiro a cópia do ‘Õ Blesq Blom‘, e eu pensei: ‘Por que eles me querem?’ Mas em seguida, eles me enviaram uma cópia de “Tudo ao Mesmo Tempo agora” e eu disse a mim mesmo: ‘Oh, ok, agora eu entendi, eles são realmente uma banda de rock.’ Os Titãs disseram que queriam fazer um disco de rock de verdade e eu lhes disse: ‘É isso que eu faço.’”
A investida deu certo, muito embora alguns fãs tenham torcido o nariz, talvez influenciados pelo o que a crítica especializada dizia, especialmente por se referir ao disco, de forma pejorativa como “o disco grunge do Titãs”, até porque, ali não tem nada de grunge, o que percebemos é muito peso, algumas partes mais core e até mesmo flertes com o Metal. Então a banda dava de ombros e nos presenteava com um ótimo disco de Rock, o melhor lançado até então.
Recentemente, o ex-baixista Nando Reis publicou um vídeo em seu canal oficial no YouTube, onde ele conta que o produtor Butch Vig, que ganhou notoriedade ao produzir o super aclamado “Nevermind”, do Nirvana, porém, Jack Endino aceitou o desafio e Vig sequer recebeu o convite.
Os sete integrantes então, partiram juntamente com Jack Endino para o Rio de Janeiro, no estúdio “Nas Nuvens“, o mesmo em que a própria banda já havia lançado o seu maior clássico, “Cabeça Dinossauro“, e também o Sepultura gravou o “Beneath the Remains“, deixando claro que à época, a banda de Max Cavalera escolheu exatamente esse mesmo estúdio pelo fato de o Titãs já ter gravado por lá, e até os dias de hoje, Andreas Kisser admite tal fato. E em pouco mais de 38 minutos de música, percebemos o quão excelente fora o resultado das gravações. Vamos colocar a bolacha para rolar e dissertar sobre cada petardo que compõe o aniversariante do dia:
A abertura se dá com a pesada “Será que é Isso que eu Necessito?“, em que as batidas certeiras do competente baterista Charles Gavin, juntamente com as guitarras sujas e jamais vistas pela dupla Tony Bellotto e Marcelo Fromer dão as cartas, além do vocal revoltado de Sérgio Britto, onde a banda já chega chutando a porta e avisando que não estão para brincadeira. Ótimo começo.
“Nem Sempre se Pode Ser Deus” foi a música que na época me chamou a atenção. Lembro-me que em 1993, eu ainda era um adolescente que era influenciado pelas músicas que tocavam nas rádios. E essa foi uma que eu conheci no dial. Ela não é tão pesada quanto a anterior, mas é igualmente linda, com um andamento um pouco mais rápido, e aqui a gente percebe a influência mais Punk, e claro, lembrando um pouco do que fora mostrado pela banda em “Cabeça Dinossauro“, oito anos antes.
“Disneylândia” é uma das mais pesadas do álbum, coim riffs hipnotizantes e uma letra inteligentíssima, que critica a globalização. O peso se mostra mais presente ainda. A performance de Paulo Miklos é sensacional. Parte da letra fora utilizada como questão no ENEM do ano de 2013. O nível do disco segue nas alturas.
“Hereditário” é uma das minhas favoritas, não só do álbum, mas de toda a carreira da banda. A intro com o órgão tocado por Sérgio Britto e depois a levada mais Punk, somada com a interpretação de Nando Reis (N. do R: que foi a única faixa em que ele cantou neste álbum e que após o vídeo que ele gravou, ficou claro a razão para ele ter uma participação tão modesta no play) são os destaques dessa faixa.
“Estados Alterados da Mente” é uma faixa em que a banda flerta um pouco com o Metal. Pesadaça, suja, maravilhosa. Tenho certeza de quem acompanhava a banda nesta época tomou um baita susto ao escutar essa faixa e duvidara de que era mesmo um disco do Titãs, tamanha a agressividade.
“Agonizando” tem uma batida mais core, igualmente interessante como as faixas anteriores. Riffs de guitarras muito bons e era difícil crer que os caras alcançariam resultados tão excelentes fazendo um som completamente diferente de tudo que fizeram até aquele momento.
“De Olhos Fechados” é outra com uma pegada mais punk, e a dupla Tony Bellotto e Marcelo Fromer esbanjando riffs pesados. “Fazer o Quê?” é a faixa que na versão cassete (N. do R: lembre-se, o caro leitor está lendo uma crônica de um quarentão), e era essa que eu tive antes de ter o CD, abre o lado B. Ela tem uma intro longa e bem chatinha, mas quando as guitarras começam a pedir passagem, logo a música cresce, se tornando uma das melhores do disco. Até aqui nada a reclamar.
“A Verdadeira Mary Poppins” embora mantenha o peso, é uma que lembra um pouco mais a fase mais Pop da banda. E ela não é ruim, pelo contrário. Lembro-me que a conheci quando escutei uma coletânea da banda chamada “Titãs 1984-1994” e isso me motivou a procurar pelo disco homenageado de hoje. “Felizes São os Peixes” é outra com veia Punk, curta e grossa, em letra que tem apenas uma linha. E nem precisa de mais. As guitarras pesadíssimas falam por sí só, com direito a riffs estupendos no final, quando a banda opta por um andamento mais cadenciado, voltando a velocidade para encerrar de forma épica.
“Tempo Pra Gastar” é o ponto fora da curva. Não é das melhores do disco, mas isso não tem problema nenhum, é apenas uma questão de preferência mesmo, pois ela segue pesada. “Dissertação do Papa Sobre o Crime Seguida de Orgia” é uma música em que Branco Mello recita a letra. E ela é fantástica, pois fala de História e este que vos escreve é um… Bingo! Historiador! Engraçado que quando eu escutava essa música, lá nos anos 1990, eu ainda estava concluindo o ensino médio e nem pensava em cursar História, mas sempre fui fascinado pela matéria e pelo que é narrado nesta letra. O instrumental segue o ritmo proposto pela banda: peso, peso e mais peso, com um andamento mais cadenciado, bons riffs e um solo interessante, coisa rara em se tratando de Titãs, pois os caras não são exatamente virtuosos. Por motivos óbvios, ela é eleita a minha favorita do disco.
“Taxidermia” encerra com chave de ouro um disco simplesmente sensacional. A faixa começa com linhas de baixo distorcidas e medonhas, mas logo vira um Hard Rock bem tocado. Por muito tempo ela foi a minha favorita deste play.
Então chegamos ao fim de um disco muito bom, que com certeza influenciou algumas bandas que viriam depois. Foi durante a turnê deste álbum que a banda (ou parte dela) criou o selo “Banguela Records” em que lançou algumas bandas que estão até hoje tocando por ai, como um “tal de” Raimundos, inclusive sendo esta, a banda de abertura nos shows da turnê deste álbum. E este redator que vos escreve percebe que está ficando velho quando lembra de detalhes de um álbum lançado já no longínquo ano de 1993.
O trabalho de Jack Endino foi sensacional. Ele gravaria outros discos com a banda, mas jamais superaria o que foi feito aqui, até porque o Titãs abriu mão de fazer Rock após “Titanomaquia“, o que é uma pena. Mas hoje é dia de celebrarmos esse disco, que de Grunge, só tem a rebeldia, porque ele é bom, pesado e com certeza por ser incluído na lista dos melhores álbuns do Rock brasileiro.
Um disco para quem é saudosista e curte um som pesado, direto e sem frescura, certamente a obra-prima do outrora septeto. Hoje é dia de exaltarmos esse play fantástico. Se você não conhece, está perdendo tempo, porque essa é uma dádiva do Rock tupiniquim. 31 anos e envelhecendo muito bem, obrigado.
Titanomaquia – Titãs
Data de lançamento – 10/07/1993
Gravadora – WEA
Faixas:
01 – Será que é Isso que eu Necessito?
02 – Nem Sempre se Pode ser Deus
03 – Disneylândia
04 – Hereditário
05 – Estados Alterados da Mente
06 – Agonizando
07 – De Olhos Fechados
08 – Fazer o quê?
09 – A Verdadeira Mary Poppins
10 – Felizes são os Peixes
11 – Tempo pra Gastar
12 – Dissertação do Papa Sobre Crime Seguida de Orgia
13 – Taxidermia
Formação:
Branco Mello – vocal
Charles Gavin – bateria
Marcello Fromer – guitarra
Nando Reis – baixo/ vocal em “Hereditário”
Paulo Miklos – vocal
Sergio Brito – vocal
Tony Bellotto – guitarra