Leprous faz show enérgico e reforça laços com fãs em show na capital paulista
Apresentação, que finalizou a terceira passagem da banda pelo Brasil, contou com total entrega dos membros, votação para escolha de música “old school” e coro com fãs entre momentos de destaque da noite
Texto por: TIago Pereira
Fotos: Gustavo Diakov
Bandas de Metal Progressivo tendem a realizar shows com uma riqueza de detalhes tanto do lado musical, quanto do visual e performático. E com o Leprous, banda norueguesa formada em 2001 e que também tem notoriedade por seus membros integrarem a banda de apoio de Isahn (Emperor), não somente não foi diferente, como houve um incremento de interações com o público precisamente interessante. A situação, claro, foi o que marcou a terceira passagem do grupo pelo Brasil, no último dia 13 de março, no VIP Station, na Zona Sul da capital, sob produção da Estética Torta.
Esse show foi o último dos três que o grupo fez em solo brasileiro, marcando assim a primeira vez que não houve exclusividade para a capital paulista e, principalmente, a continuidade da turnê de divulgação do mais recente álbum da banda, “Melodies of Atonement”, lançado em agosto de 2024. As outras capitais brasileiras foram Belo Horizonte (11) e Curitiba (12). Houve, também, shows pelo México – Guadalajara, Monterrey e Cidade do México -, Costa Rica – San José – e Colômbia – Bogotá – antes dos anteriormente citados, além dos shows posteriores em Santiago, no Chile, e Buenos Aires, na Argentina.
Apesar de o público presente no VIP Station ter ocupado até pouco menos da metade da pista da casa, as interações e receptividade dos presentes, somadas à aula de transições de momentos lentos para mais agitados e da energia disposta pela banda nos lados musical e performático, foram fatores que fizeram com que este detalhe de pagantes fosse mínimo.
O Leprous não somente trouxe as faixas do mais novo álbum, como também passou pelo repertório de cinco dos outros sete álbuns – as exceções foram o disco “Coal” (2013) e “Bilateral” (2011), sendo o segundo devido a uma escolha do público que envolveu uma música do álbum anterior, “ Tall Poppy Syndrome” (2009). Assim, o setlist veio recheado, com 16 músicas tocadas dentro das duas horas de apresentação.
E claro, além do lado musical, que mostrou o melhor de cada músico e até a flexibilidade de alguns no palco, seja por tocar mais de um instrumento, seja pela performance enérgica, o Leprous trouxe as interações com o público como um fator dosado e totalmente acertado no alvo. Isso veio, claro, com os discursos encabeçados pelo vocalista Einar Solberg, pela votação entre “Passing” e “Forced Entry” para o setlist, os gestos de carinho dos fãs e da banda e, como maior destaque, pela escolha de fãs para dividir o palco com a banda, no coro que finalizou a música “Faceless”.
Momentos antes do show
O VIP Station teve cerca de um terço da pista ocupada até 15 minutos antes da apresentação, além de alguns pequenos grupos ao fundo em rodas de conversa ou consumindo bebidas à venda da casa. O aumento foi pouco até o horário da apresentação.
Tal situação permitiu um avanço mais tranquilo para as partes frontais, o que permitiu uma visão melhor do preparo dos roadies presentes. O destaque foi a quantidade de garrafas de água para cada membro da banda – de seis a sete -, um possível indicativo tanto da temperatura do palco, quanto à necessidade de hidratação por conta de um show mais enérgico.
A apresentação em si começou às 20h34, com o apagar total das luzes do palco. Todos os membros da banda entraram juntos, sem uma ordem definida, o que acabou de vez com a possível ansiedade presente nos fãs mais assíduos do grupo.
Uma noite enérgica e de total atenciosidade
Einar Solberg (vocal e teclado), Robin Ognedal (guitarra), Tor Suhrke (guitarra e backing vocal), Simen Børven (baixo), Baard Kolstard (bateria) e Harrison White (teclado) sentiram a receptividade do público logo na entrada ao palco e ao se posicionarem em seus postos. Foi o necessário para que o sexteto desse o cartão de visitas da apresentação com “Silently Walking Alone”, música que também abre o álbum de estúdio mais recente da banda, “Melodies of Atonement” (2024). Apesar dos primeiros segundos da música terem uma leve falha de volume do microfone para o público, Einar e o restante da banda esbanjam energia principalmente nas partes de refrão, gerando muitos aplausos do público ao final da faixa. Tudo isso com a capa deste álbum no telão central, ao fundo do palco.
A segunda faixa foi uma verdadeira “pedrada” comemorada pelo público: “The Price”, um dos maiores sucessos do Leprous e que compõe o quarto disco de estúdio, “The Congregation” (2015), além de de acordes pesados no início e uma linha repetitivamente boa logo depois – que contou com coro lírico do público nesta parte -, contou com Einar dividindo o kit de teclados com Harrison em certos momentos, além de o sexteto deixar o público totalmente hipnotizado com a sonoridade perfeita da faixa, algo que foi quebrado com a energia vocal de ambas as partes – palco e pista – durante os refrões.
Einar Solberg ainda parou para lembrar sobre esta ser a terceira passagem da banda pelo Brasil e, claro, não esquecer das passagens anteriores pela capital paulista. Os agradecimentos pela presença dos fãs ao VIP Station logo foram emendados para “Illuminate”, uma das duas faixas do disco “Malina” (2017) a ser tocado no setlist. O predomínio das luzes amarelas – e feixes de luz branca – foram um destaque somado ao afinamento vocal impecável de Einar ao longo da música. Depois, a banda voltou ao repertório do álbum “Melodies of Atonement” com a dobradinha das faixas “I Hear the Sirens”, destacada novamente na voz de Einar – desta vez, ora doce, ora em falsetes elogiados pelo público – e nas performances de Robin Ognedal e Simen Daniel Børven., e “Like a Sunken Ship”, iniciada sob o destaque de iluminação em Simen no início e na escalada de peso da música em questão, do lento e calmo para o pesado e quase caótico, mostrando o melhor dos músicos nessa parte.
Einar trouxe outro discurso à tona, indicando que a banda cantaria uma faixa “old school” e perguntando quem conheceu a banda na fase inicial do grupo. Ele jogou aos fãs, perguntando o que queriam que o grupo e pedindo para que decidissem entre “Passing”, do disco “Tall Poppy Syndrome” (2009), e “Forced Entry”, do LP “Bilateral”. Um dos fãs, no meio da galera, chegou a levantar um pequeno cartaz com o nome da primeira faixa citada, assim como havia mais pedidos do mesmo modelo na frente da pista. O resultado se deu justamente à música mais antiga, que foi tocada sob uma cadência impecável de todos os músicos, por todas as fases da faixa – das partes mais calmas às mais pesadas. Ainda houve, durante a faixa, espaço para momentos tão descontraídos quanto no discurso e votação, com Einar e demais músicos brincando com a intensidade das ovações do público, e para eles esbanjarem uma mistura absurda de energia performática com a sonoridade mais pesada ao final da música em questão..
“Distant Bells” foi a sétima música da noite e a primeira a representar o disco “Pitfalls” (2019). O início focado no teclado (em sonoridade de piano desta vez) de Harrison White, que começou sozinho enquanto os demais davam uma pequena pausa antes de voltar ao palco. Infelizmente, algumas pessoas mais ao fundo conversaram alto no meio desta execução, o que incomodou a quem queria prestar atenção ao show e à sonoridade e levou a pedidos de silêncio no famoso “shh”. Einar, às escuras, foi o primeiro a voltar e acompanhar Harrison neste início que, depois, contou com uma linda condução da parte de Baard Kolstard e seus pratos no kit de bateria, seguido das linhas “entrelaçadas” dos guitarristas. Todo esse processo levou a uma parte final mais agitada e perfeitamente interligada da banda, a destacar mais dos belos falsetes de Einar e o coro dos backing vocals nos “oh ooohs” feitos no ritmo do instrumental geral até o final.
Chegou, então, a vez de o álbum “Aphelion” (2021) ser representado por sua última faixa, “Nighttime Disguise”, que, sob luzes verdes predominantes, contou com ótimas linhas novamente entrelaçadas dos guitarristas e slaps poderosos do baixista Simen Børven. Einar foi praticamente perfeito mais uma vez, alternando entre a vocalidade mais doce ao longo da faixa e se destacando com notas mais altas no refrão (acompanhado pelo público neste momento) e vocais mais sujos na parte final. A beleza sonora da faixa em geral também deu espaço para mais da performance energética do grupo em momentos mais agitados, intensificados pela alternância frenética das luzes. Baard também foi destaque ao pedir por palmas ao se levantar e subir em seu banco, antes de voltar com tudo para a reta final desta música.
“Unfree My Soul” trouxe mais um misto de energias e performance da banda, com um começo destacado pelos fraseados dos guitarristas e o apoio que Harrison fez para Bard, sendo praticamente um percussionista auxiliar ao bater, no mesmo tempo e ritmo do baterista, em caixas paralelas, reforçando o poderio de impacto nesta parte – ele quase perdeu o tempo de voltar para seu posto e tocar com o vocalista e, nisso, voltou correndo a ponto de gerar risadas próprias e as de Solberg. Einar, ao fundo do palco e perto do teclado, voltou a fazer uma miscelânea admirável de notas doces e falsetes, com pontos mais altos no refrão. Seu retorno à frente veio apenas nos momentos finais.
Fãs presentes na parte mais frontal da pista provavelmente perceberam o suor da banda por um todo, fator que envolveu o calor no local e que foi destacado por Einar Solberg no discurso que fez antes da continuidade ao show. Foi, inclusive, o momento em que ele buscou os fãs que estiveram nas passagens anteriores da banda por São Paulo.
O retorno da apresentação se deu com outro sucesso da banda, “Below”, que também representou o álbum “Pitfalls”. O coro do público se fez presente e forte novamente tanto nos momentos mais calmos, como nos refrões. Vale destacar a atuação de Baard na faixa, tanto com as batidas pesadas em um refrão comumente lento, quanto numa segunda parte em que fez um ótimo uso de uma caixa mais “oca”, somada à versatilidade de seus pratos. Todos esses elementos, claro, geraram muitos aplausos por parte do público.
“Faceless” não só retomou a apresentação a um contexto do material mais recente do Leprous, como também trouxe o momento mais especial da noite. Antes, Einar, em nome da banda, dedicou o som aos fãs antes de Simen puxar acordes mais graves junto às batidas de Baard e as linhas dos demais instrumentistas. A virada de “peso” veio no segundo terço da faixa, com batidas mais fortes da bateria e linhas mais fortes dos guitarristas, tudo somado a uma nova versatilidade vocal do frontman do Leprous. Tor Oddmund ainda fez um solo simples, mas destacado por estar ao centro do palco e sob iluminação. Praticamente uma “introdução” ao que viria na sequência: sob o chamado de Einar, nove fãs escolhidos ao longo da apresentação subiram ao palco e, divididos em trios, foram aos microfones para repetir, em coro, os versos “Never Go Alone” e “Never the Unknown”. O encerramento desta parte, claro, não poderia ser outro a não ser uma série de aplausos e ovações do público em geral. Uma realização e tanto para o noneto escolhido.
Foi ao final da faixa anterior, ainda, que Einar recebeu uma demonstração de carinho singela de uma das fãs que subiram ao palco, ao receber uma capivara de pelúcia como presente de recordação. O nome do animal foi repetido aos montes pelo público na pista, enquanto o vocalista o apresentava com semblante total de gratidão.
A apresentação seguiu com a belíssima “Castaway Angels”, com metade da faixa focada nas linhas de piano de Harrison, com a doce voz de Einar e o acompanhamento do público no refrão. Na outra parte, a entrada das linhas de bateria de Baard e as linhas suaves dos guitarristas ajudaram a atenuar os tons mais agudos do vocalista, em uma condução geral novamente impecável.
Antes do encore, o grupo tocou mais duas faixas. Uma delas foi a também comemorada “From the Flame”, cuja sonoridade levou o público a um raro momento de pulos na pista em meio a uma condução vocal incrível de Einar e o instrumental volátil e impressionante dos músicos – a destacar as viradas de Baard, na bateria, antes do terceiro refrão -, além do maior pico de ovações ao final da faixa; e “Slave”, que contou com um início de notas distorcidas dos instrumentistas de cordas – presentes nos pedestais frontais do palco -, além de outro coro que acompanhou a voz de Einar Solberg do primeiro verso até o fim do refrão; e uma espécie de breakdown que tornou o palco um local “controladamente caótico”, com uma performance enérgica de todos os integrantes do Leprous e bangings de boa parte dos fãs na pista. Tudo isso sob guturais absurdos de Einar.
O clássico grito “Olê, olê, olê, olê” veio na pausa da banda, seguido do nome da banda. E foi assim até a volta da banda, que deu uma “ajudinha” no ritmo deste coro com os bumbos de Baard, além de vir por um todo à frente do palco para demonstrar gratidão aos fãs. Einar voltou a discursar, elogiando o público e a cidade de São Paulo.
Para o ato final do show, os membros do Leprous tocaram mais duas faixas. A primeira foi “Atonement”, iniciada com um beat leve vindo do kit de Harrison, mas logo puxada para um ritmo prog liderado principalmente pelas notas frenéticas de Robin Ognedal, que lembraram um sintetizador. Tudo isso, claro, junto à performance enérgica do grupo, que pulava e se mexia como dava em seus espaços, somado ao uso do telão central como outra iluminação a piscar freneticamente com os canhões de luz nestas partes.
Já a última foi “The Sky Is Red”, cuja versão de estúdio, no álbum “Pitfalls”, tem 11 minutos e que, no VIP Station, teve apenas os três minutos finais tocados pela banda. Justamente os minutos mais frenéticos da faixa, iniciados após uma ambientação de luzes vermelhas e notas longas dos teclado de Harrison e Einar, se transformaram gradualmente conforme novas linhas dos demais instrumentistas entravam nesta parte da faixa. E esta “frenesi” cresceu com a entrada das linhas de baixo, guitarra e, por fim, da bateria de Baard, que deu ritmo também aos últimos momentos de pulos e balanços caóticos dos membros da banda, em meio a uma mistura de luzes e um telão central com “raios horizontais”. Todo esse caos terminou em uma finalização em que todas as luzes ficam brancas e o telão mostrou a capa do último álbum da banda. E com o fim da performance da banda, o público demonstrou sua avaliação positiva e agradecimento pelo show com mais ovações e gritos de “Leprous”. Os agradecimentos vieram com reverências ao público, jogadas de palhetas e baquetas e dos setlists – um deles, inclusive, jogado como um aviãozinho por Harrison, chegando ao meio da pista.
Dos fãs que foram ao palco aos que presenciaram o show pela pista, a sensação pós-show é a de que todos foram impactados positivamente e que, claro, curtiram totalmente a apresentação, muito bem dosada entre a passagem por um pouco de cada álbum e, claro, a entrega que a banda fez no show por um todo. Entrega essa que justificou as tantas garrafas de água no palco para cada membro. Que voltem logo para as terras brasileiras e que possam ter um público ainda maior, algo que a banda demonstrou merecer e muito depois do que fizeram no VIP Station.
Confira o setlist da noite:
- Silently Walking Alone
- The Price
- Illuminate
- I Hear the Sirens
- Like a Sunken Ship
- Passing (escolha do público após votação feita pela banda entre ela e “Forced Entry”)
- Distant Bells
- Nighttime Disguise
- Unfree My Soul
- Below
- Faceless (com coro de nove fãs na parte final da faixa)
- Castaway Angels
- From the Flame
- Slave
Encore:
- Atonement
- The Sky Is Red (apenas instrumental da parte final da música)