Resenha: Gorefest – “Mindless”

Revisitar as raízes do death metal europeu é sempre um exercício necessário, especialmente quando falamos da cena holandesa do final dos anos 80 e início dos 90 — um terreno fértil que gerou nomes essenciais do gênero. Entre eles está o Gorefest, banda que muitos fãs conheceram por trabalhos mais maduros, como “Erase”, mas cuja gênese merece igual atenção. A reedição promovida pela Metal Mind Productions resgata justamente esse ponto de partida ao reunir, em um box duplo, o álbum de estreia “Mindless” (1991) e suas primeiras demos, que agora é relançado pela parceria Nuclear Blast/Shinigami Records.

Assim como contemporâneos como Sinister, Thanatos, Pestilence e Asphyx, o Gorefest fazia parte daquela erupção de death metal que tomou conta da Holanda na virada da década. Mas, ao contrário de muitos grupos que mergulhavam em ocultismo ou mitologia infernal, o quarteto preferia explorar os horrores psicológicos, a decomposição humana e as distorções da mente — temas suficientemente perturbadores para alimentar pesadelos e causar desconforto até em ouvintes experientes.

Musicalmente, o som dessa fase inicial se aproxima mais do death metal americano de nomes como Autopsy, ou mesmo do ataque britânico do Napalm Death, do que dos compatriotas. “Mindless” e as demos incluídas no relançamento trazem aquele espírito cru, quase primitivo, de uma época em que o estilo apostava menos em técnica e mais em brutalidade. O Gorefest não buscava a sofisticação instrumental de um Death, mas compensava com riffs espessos, diretos e repetitivos de forte impacto, além dos vocais viscerais de Jan-Chris de Koeijer, que adicionam a camada exata de sujeira e grotesco ao conjunto.

Faixas como “Decomposed”, “Putrid Stench of Human Remains”, “Horrors in a Retarded Mind”, “Tangled in Gore” e “Mental Misery” traduzem o clima de sofrimento e violência que a banda pretendia transmitir — um retrato sonoro marcado por monotonia propositada, peso constante e atmosfera claustrofóbica. Para quem aprecia o death metal em sua forma mais crua, há um charme evidente na simplicidade dos riffs e nos lampejos ocasionais de melancolia que surgem nas guitarras solistas.

O material das demos, gravado entre um e dois anos antes do álbum, evidencia como o Gorefest consolidou rapidamente sua identidade. As diferenças são mais de produção do que de composição — o que torna especialmente interessante acompanhar a evolução das faixas até sua forma final em “Mindless”. Entre os registros antigos, o demo “Horrors in a Retarded Mind” se destaca pela energia e pela ferocidade que antecipavam o potencial da banda.

A reedição não é apenas um item para colecionadores: trata-se de um documento histórico que ajuda a entender como o death metal holandês se formou e por que o Gorefest ganhou espaço entre os nomes mais relevantes de sua cena. Para fãs do gênero, é uma peça obrigatória; para curiosos, uma oportunidade de mergulhar em um capítulo essencial da música extrema europeia.

NOTA: 8

Marcio Machado

Formado em História pela Universidade Estadual de Minas Gerais. Fundador e editor do Confere Só, que começou como um perfil do instagram em 2020, para em 2022 se expandir para um site. Ouvinte de rock/metal desde os 15 anos, nunca foi suficiente só ouvir aquela música, mas era preciso debater sobre, destrinchar a obra, daí surgiu a vontade de escrever que foi crescendo e chegando a lugares como o Whiplash, Headbangers Brasil, Headbangers News, 80 Minutos, Gaveta de Bagunças e outros, até ter sua própria casa!

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