Fleshgod Apocalypse supera tragédia pessoal e atinge o ponto alto da sua carreira com o brilhante “Opera”

“As melhores histórias sempre vêm da dor. É uma verdade amarga, mas inegável”.

A frase acima poderia ser atribuída a um filósofo, um pensador ou mesmo algum inspirado pessimista, mas ela é de uma pessoa que por muito pouco não teve a chance de escrevê-la: no caso, Francesco Paoli, vocalista do FLESHGOD APOCALYPSE.

Enquanto em 2021 boa parte da população mundial estava confiada em suas casas por causa da pandemia do Covid-19, Francesco sofria no dia 21 de agosto daquele ano um grave acidente ao escalar as montanhas Gran Sasso (“Pedra Gigante”), em Abruzzo, Itália.

O resultado do acidente foram ossos quebrados, músculos rompidos e anos para se recuperar – a coisa toda foi tão feia, que mesmo após descartado o risco de morte, havia a hipótese de que ele não pudesse mais tocar alguma instrumento por conta das possíveis sequelas.

Entre muitas cirurgias e sessões de fisioterapia, o músico compartilhava sua rotina de recuperação e chegou a montar um pequeno estúdio em seu quarto. E dessa dura rotina que surgiu “Opera” (2024), sexto disco do FLESHGOD APOCALYPSE.

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“Mais um disco inspirado em experiência de quase morte…”, alguém pode logo dizer, mas imagine ser a SUA experiência de quase morte e como isso te afetaria.

Obviamente, todas as letras abordam o acidente e seus impactos físicos e mentais sobre Francesco, gerando reflexões sobre a vida, família, futuro, etc. O acidente é narrado em detalhes em vários trechos, mas dá para perceber que algumas músicas foram feitas mais no começo do processo de recuperação devido sua abordagem mais pessimista de como tudo aquilo terminaria e outra parte mais ao final do processo, devido, aí sim, por uma visão positiva de tudo que a vida dali em diante ofereceria para ele e para a banda.

E a melhor forma de se narrar tantos medos, esperança e outras dualidades tão intensas só poderia ser mesmo pela ópera (acompanhada de um metal bem pesado). Como se fossem atos, as faixas podem ser separadas em três grandes partes: a grandiosidade de tudo, o drama vivido e a bravura em lutar, sendo as faixas dramáticas, minhas favoritas: “Pendulum” tem uma obscura e cativante atmosfera; o rolo compressor “At War With My Soul” traz muito peso, mesmo com andamento mais lento; “Matricide 8.21” tem uma pegada mais de metal melódico do que death metal e “Till Death Do Us Part” é quase toda cantada por Veronica Bordacchini, velha conhecida da banda desde seus três primeiros discos participando em faixas esporádicas, mas que aqui assumiu um papel crucial no disco com seus vocais belos dinâmicos, alternando entre a fúria, o cantado e o operístico.

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“Conseguimos transformar uma das piores coisas da vida em uma obra de arte, que incorpora nosso crescimento pessoal e artístico e leva os ouvintes a uma montanha-russa de emoções, onde eles podem vivenciar o que eu passei, lado a lado comigo. É um pesadelo acordado, mas é assim que a vida é às vezes, simplesmente assustadora”, resume Francesco.

Toda essa orquestração e complexidade musical exigem uma caprichada produção, outra etapa superada. Gravado em Roma, no Bloom Studios a sonoridade do disco é impecável, outro ótimo trabalho de Marco “Cinghio” Mastrobuono, mesmo produtor dos então dois últimos trabalhos do grupo, “King” (2016) e “Veleno” (2019) e mixagem e masterização do nomeado ao Grammy desse ano, Jacob Hansen (ARCH ENEMY, THE BLACK DAHLIA MURDER, HEAVEN SHALL BURN, PRIMAL FEAR).

E como a ópera pede grandiosidade também no quesito visual, a parte gráfica é o outro destaque do disco. A bela capa, retratando a vitória da vida sobre a morte, é obra de Felicita Fiorini. O encarte como um todo é muito bonito, cheio de cores fortes, sobretudo o vermelho e o negro contrastando, ainda que algumas letras estejam impossíveis de serem lidas ali, mas nada que uma busca rápida não as revele.

Lançado no Brasil pela Shinigami Records em parceria com a Nuclear Blast Records, “Opera” (2024) é provavelmente o ponto alto da carreira do FLESHGOD APOCALYPSE – ainda que tenha surgido de uma forma (quase) trágica.

Nota: 9

 

Já que “Curta é a vida e longa é a arte”, então aproveite esse baita disco!

Formação:

Francesco Paoli:  vocais, guitarra, baixo

Francesco Ferrini : piano, orquestração

Eugene Ryabchenko: bateria

Fabio Bartoletti: guitarra

Veronica Bordacchini: vocais

Faixas:

01 Ode to Art (De’ Sepolcri) (intro)

02 I Can Never Die

03 Pendulum

04 Bloodclock

05 At War With My Soul

06 Morphine Waltz

07 Matricide 8.21

08 Per Aspera Ad Astra

09 Till Death Do Us Part

10 Opera (instrumental)

Mario Pescada

Mineiro, leitor compulsivo, ouvinte de todas as vertentes do rock - do blues ao grindcore. Valoriza mais a honestidade e entrega em cima do palco do que a técnica. Guarda os flyers dos shows que vai como se fossem relíquias. Autor do livro "Distorções do Submundo: Dissecando álbuns matadores do underground brasileiro" lançado pela Editora Denfire.

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