Apocalyptica encanta Carioca Club com setlist diversificado e covers que consagraram início de carreira da banda
Texto: Tiago Pereira
Fotos: André Tedim
A banda finlandesa de Metal Sinfônico, Apocalyptica, agradou e entreteu os fãs em São Paulo na última sexta-feira (19), em apresentação no Carioca Club, localizado na Zona Oeste da capital. O show foi o terceiro de cinco realizados no Brasil, em sua quinta passagem no país, sendo todos parte da turnê “Cell-0”, que passou por outras quatro cidades brasileiras: Porto Alegre, Curitiba, Brasília e Rio de Janeiro – as duas primeiras cidades foram em datas anteriores à de São Paulo. O evento foi realizado pela Free Pass e contou com a abertura da banda brasileira Allen Key.
O show marcou um curto intervalo de quase nove meses entre a volta para a capital paulista e a última passagem, no Memorial da América Latina, pela primeira edição do festival Summer Breeze. Além disso, dois fatos curiosos marcaram a apresentação: a ausência do baterista Mikko Sirén, substituído na turnê por Mikko Kaakkuriniemi, e a presença de Erik Canales (Allison) nos vocais de algumas das faixas do setlist.
A noite de sexta-feira teve na forte chuva um possível empecilho para os fãs chegarem mais cedo no local, mas não foi fator de atraso para as atrações. A casa só ficou mais cheia em meados do show de abertura, atingindo uma lotação considerável na apresentação principal – com pequenos vácuos ao fundo da pista e poucas áreas sem preenchimento no mezanino.
Enquanto o Allen Key focou em faixas de seu álbum de estreia, “The Last Rhino” (2021), e nos singles mais recentes, o Apocalyptica montou um setlist que mesclou faixas autorais de seu repertório, covers de Sepultura e Metallica e pequenos trechos de músicas clássicas e até de outras bandas, como Rage Against the Machine.
No pré-show, apesar da chuva, muitos fãs estavam com garrafas de água, latas de cerveja e até casquinhas de sorvete – estas vendidas na região do merchan – em mãos, como uma forma de se refrescar de um calor interno – e até externo – que os atrapalharam naquele momento. Os ares condicionados do local até ajudaram enquanto havia poucas pessoas no local, mas não foram suficientes noite adentro, mesmo que a situação não ficasse crítica.
Apocalyptica
No intervalo entre os shows, o maior destaque foi a equipe de desmontagem que, em menos de dez minutos – dos 30 restantes para o início da apresentação dos finlandeses -, foi realizada, deixando apenas o kit de bateria de Mikko Kaakkuriniemi ao meio e alguns equipamentos de som à direita do palco, na visão dos espectadores. Foi algo que poucas vezes vi na transição de uma banda para outra e que, com certeza, apostaria numa mesma situação caso a banda principal tocasse com guitarras e contrabaixos;
Pouco tempo depois, a chegada dos microfones e alguns pedais finalizaram a montagem “básica” do Apocalyptica. Fãs com camisas da banda finlandesa e do Metallica eram visíveis em todos os cantos, assim como poucas demonstrações de ansiedade, talvez pelo intervalo curto previsto. Em volta, apenas o fundo da pista estava mais vazio e, no mezanino, havia poucos espaços vazios nas áreas VIP.
Às 22h02, as luzes se apagaram por definitivo e uma introdução em tema ambiental surgiu no telão do palco, com uma paisagem com plantas e que transitou para um chão seco e rachado, numa possível crítica dentro do tema. Mikko Kaakkuriniemi (bateria) foi o primeiro a entrar e, pela pouca receptividade, talvez tenha causado estranheza àqueles que não sabiam da ausência de Mikko Sirén. Em seguida, o trio de violoncelistas Eicca Toppinen, Paavo Lötjönen e Perttu Kivilaakso entrou no palco e agitou de vez os presentes no Carioca Club.
O grupo começou o show com “Ashes of the Modern World”, faixa que também inicia o mais recente álbum, “Cell-0” (2020). A iluminação ajudou muito na visão dos músicos da frente, algo que acabou por se tornar raro na conjuntura total, mas que auxiliou nas gravações e fotos.
A banda, sem viradas, trouxe “For Whom The Bell Tolls”, cover do Metallica, como segunda faixa, vivenciando, assim, os primórdios da banda finlandesa, cujos primeiro e segundo álbuns, “Plays Metallica by Four Cellos” (1996) e “Inquisition Symphony” (1998), são um tributo à banda de Heavy e Thrash Metal californiana – apesar de o segundo álbum também conter faixas de Sepultura, Pantera e Faith No More -. Os fãs das duas bandas puxaram os pulos, gritos de “hey” e aplausos no ritmo da faixa, além de uma parcela que se arriscou a cantar a música por um todo, e não somente o refrão. Perttu Kivilaakso, inclusive, impressionou com o início da faixa, que se assemelhou muito ao baixo distorcido de Cliff Burton. Da mesma forma, a banda quebrou a expectativa animada da faixa ao deixar Eicca Toppinen tocar, sozinho, o riff da música por alguns segundos, o que não causou estranheza, mas sim um novo puxar de palmas no ritmo do trecho.
A banda seguiu com “Grace”, primeira faixa do álbum “Worlds Collide” (2007) e que, originalmente, conta com a participação do músico japonês Tomoyasu Hotei. O ritmo animado e os agudos bem puxados por Kivilaakso fizeram Eicca e Paavo puxarem algumas dancinhas enquanto davam ritmo à faixa.
Um novo pico de ânimo da plateia veio com “Refuse/Resist”, cover do Sepultura e que, no contexto de despedida da banda brasileira, soou como uma homenagem – mesmo que não anunciassem como tal, uma vez que a faixa faz parte do álbum “Inquisition Symphony” -. O público, mesmo em determinada parcela, não pecou na condução vocal e nos pulos dados durante a faixa.
Erik Canales entrou para cantar “I’m Not Jesus”, também do álbum “Worlds Collide”, e “Not Strong Enough”, de “7th Symphony” (2010). A entrega do cantor da banda Allison resultou em fortes aplausos dos presentes.
Canales saiu e a produção trouxe três cadeiras para os violoncelistas. Nisso, a baixa iluminação trouxe contexto para a lenta faixa “Rise”, também do álbum mais recente da banda. O tom abstrato do telão trouxe um teor ainda mais sentimental para a faixa, que após terminada, resultou em um sonoro “PQP” de um dos fãs da pista, impressionado com a habilidade da banda, e uma sequência de aplausos ainda mais fortes.
A banda seguiu com “En Route to Mayhem”, música com ritmo mais acelerado que foi ponto de partida do lado brincalhão de Perttu Kivilaakso, expressa dali até o final da apresentação. Só nesta faixa, foram poses de admiração a Eicca, enquanto o mesmo solava, e um chifre por trás de Paavo, enquanto o mesmo conduzia muito bem o ritmo da música.
Perttu chamou Erik Canales, que retornou para mais duas faixas: “Shadowmaker” – que teve finalização calourosa com um trecho de “Killing In The Name”, do Rage Against The Machine -, e “I don’t Care”. A segunda citada, inclusive, foi muito cantada pelo público, apesar de não ter o mesmo impacto que teria com a voz de Adam Gontier (Saint Asonia e ex-Three Days Grace), vocalista que participou da faixa em sua versão de estúdio. No entanto, a anterior teve certa aclamação no final, após tentativas de pedidos de palmas sem total sucesso.
Na saída do vocalista mexicano, as cadeiras voltaram para o momento mais icônico do show: o cover de “Nothing Else Matters”, do Metallica. Poucos segundos foram necessários para o reconhecimento da faixa e, claro, a banda ficou a maior parte só no instrumental, já que os fãs fizeram questão de cantar, em coro forte, toda a letra da música. Sem perder tempo, o trio de violoncelistas virou para “Inquisition Symphony”, cover do Sepultura e que também leva o nome do segundo álbum da banda finlandesa, com total interação dos fãs por meio de aplausos e fortes balanços de cabelos de Eicca e Perttu.
Perttu Kivilaakso, inclusive, puxou um discurso de agradecimento, mesclado a pequenas brincadeiras, por tocar novamente no Brasil – e em São Paulo – e pela presença dos fãs. Junto a isso, explicou sobre como acha incrível a diferença cultural entre Brasil e Finlândia, principalmente a respeito da forma de consumir um show.
O mesmo membro fez questão de apresentar a banda, que estava no backstage. Ele chamou cada membro com claros elogios e estes se posicionaram em seus postos, no palco.
O retorno às músicas foi antecedido de uma pequena pergunta de Perttu ao público: “Vocês gostam de Metallica? Que bom, porque agora não será o Metallica que tocará, e sim o Apocalyptica que tocará mais uma música da banda”, respondeu, em tom irônico e, claro, brincando com a plateia.
Um mini medley, com “Seek and Destroy” e um pequeno trecho de “Enter Sandman”, foi o terceiro e último ato de covers do Metallica do show, o que gastou os últimos gases de energia dos presentes em termos de pulos, aplausos e cantos síncronos à banda finlandesa. Kivilaakso, impressionado com a energia dos presentes, mandou corações e solou deitado no palco, quase num estilo Angus Young.
Os aplausos dos presentes foram constantes ao final da faixa e mudaram o ritmo durante o encore da banda. Perttu Kivilaakso precisou apenas expor sua cabeça na saída da escada e dar um leve sorriso para que a plateia voltasse a ovacionar a banda.
As cadeiras retornam junto com a banda para as duas últimas faixas. “Farewell”, do álbum que leva o nome da banda, de 2005, foi a penúltima, com um ritmo lento que passou a um trecho com solo em tom agudo de Perttu.
Ao fim e após o também penúltimo discurso de Eicca Toppinen, sobre o quão bom foi voltar a se apresentar em São Paulo, a banda finalizou o show com “Peikko”, numa espécie de compilação que começou com um ritmo mais black metal e terminou em pequenos trechos de músicas clássicas, como “Can Can”. Foi o momento em que a banda estava mais solta e Perttu, em seu ápice de brincadeiras, fingiu abaixar as calças para urinar em um dos ventiladores do canto, o que gerou risadas dos fãs.
O gran finale foi a revelação de Eicca Toppinen sobre o lançamento de um novo álbum do Apocalyptica para 2024. O líder da banda também desejou que todos se cuidassem e cuidassem de seus próximos, finalizando assim uma noite com ótima abertura e que mesclou covers, faixas autorais, boas participações e uma boa dose de entretenimento em alguns momentos da apresentação principal. Uma noite que não somente teve uma ótima finalização musical, como um retorno mais calmo, sem o empecilho das chuvas.
Allen Key
A apresentação da banda brasileira de Hard Rock e Heavy Metal, Allen Key, começou às 20h44. Apesar de uma pequena introdução instrumental gravada, o início veio com o abrir das cortinas e os membros William Moura (baixo), Pedro Fornari e Victor Anselmo (guitarras) de costas para o público e de frente para Felipe Bonomo (bateria). William, inclusive, causou uma cena engraçada e momentânea, mas não desastrosa, ao derrubar o tripé e o microfone de backing vocal em um pequeno movimento do braço, o que assustou os mais próximos das caixas de som e gerou pequenas risadas dos integrantes e do próprio público.
Não demorou muito e os instrumentistas abriram com “Granted”. Karina Menasce (vocal) apareceu perto do início da letra e fez questão de banguear a cada momento oportuno da faixa, principalmente após o primeiro refrão.
“Straw House” foi a segunda faixa da noite, com Karina a introduzindo no teclado e, em uma das partes finais da música, puxando um violão customizado a glitter prateado, algo que se tornou uma marca registrada da vocalista e que demonstra sua versatilidade musical no palco. Victor e Pedro também conduziram muito bem os riffs e outras linhas da música.
Uma pequena pausa foi dada para o discurso de saudação, por Karina, para o público presente. A frontwoman da banda explicitou o desejo do grupo de tocar no Carioca Club e agradeceu, pela primeira vez, a presença daqueles que estavam na pista e mezanino.
O Allen Key prosseguiu com “Illusionism”, com Menasce a seguir com seu violão, assim como Pedro Fornari também iniciou com um modelo semelhante. Por um momento da faixa, na parte mais agitada, a voz da vocalista ficou sobreposta aos demais instrumentos, mas logo foi normalizada. Victor se destacou com o solo bem executado da faixa.
A quarta música tocada, “Sleepless”, é o último single lançado pela banda, em 01 de dezembro de 2023. O ânimo dado por Karina Menasce e os demais integrantes fez o público despertar um pouco mais e dar um retorno mais que positivo no final da faixa, com séries de aplausos e ovações merecidas.
Numa nova pausa para discurso, a vocalista da banda dedicou a faixa seguinte, “Goodbye”, àqueles que são importantes nas vidas dos presentes, mas que já foram dessa para uma melhor. Alguns segundos são dados, a pedido de Karina, para que os fãs se lembrassem de alguém muito querido e que já faleceu – e que me fez lembrar de uma tia muito querida, falecida há 20 anos. A introdução no teclado trouxe a carga emotiva da faixa e, conforme discorria, se tornava um pouco mais agitada, mas sem perder sua mensagem de despedida. Duas fãs, inclusive, chegaram a ligar as lanternas de seus celulares como uma forma de apoiar a banda, no entanto, foram notadas por Karina apenas na faixa seguinte, durante uma gravação de vídeo.
Antes de iniciar “Apathy”, faixa mais animada do setlist, o baixista Willian Moura, em poucas palavras e em tom pouco tímido, anunciou: “Galera, tá na hora do pau quebrar. Só isso”. O entendimento do público veio somente com o início da música, que trouxe novamente o ânimo à pista. Pedro tocou o solo na faixa, no entanto, sua guitarra pouco foi ouvida. Ainda assim, a dedicação ao seu momento levantou aplausos do público.
Karina voltou a agradecer a receptividade e presença da plateia na apresentação e anunciou a reta final do show. “Mr. Whiny” parecia ser a última faixa, da forma como a frontman discursou, mas a banda teve tempo para fechar com “The Last Rhino”, faixa que leva o nome do álbum, lançado em setembro de 2021. Na primeira citada, Karina ainda perguntou aos presentes quem “gostaria de brincar” com a banda naquele momento, o que resultou num retorno positivo e no surgimento de outra marca registrada da banda: os balões. A maior parte do público aderiu à brincadeira e os conduziu na pista. Alguns fãs que não gostam de balões até bateram neles com mais força, atingindo a iluminação mais alta do local, mas sem causar algum dano ou ameaça de derrubada do equipamento.
Já na segunda, não somente a condução da banda, por um todo, trouxe uma finalização de alta qualidade para um show bem conduzido, como gerou um carinho recíproco do público, com aplausos, ovações e um possível desejo de conhecer mais da banda após a apresentação. Ao todo, havia algumas nuances de uma percepção a respeito de uma possível preocupação com o tempo de apresentação, mas nada que atrapalhasse a qualidade musical da banda num geral.
Setlist Allen Key
- Granted
- Straw House
- Illusionism
- Sleepless
- Goodbye
- Apathy
- Mr Whiny
- The Last Rhino
Setlist Apocalyptica
- Ashes of the Modern World
- For Whom the Bell Tolls (cover de Metallica)
- Grace
- Refuse/Resist (cover de Sepultura)
- I’m Not Jesus (participação de Erik Canales)
- Not Strong Enough (participação de Erik Canales)
- Rise
- En Route to Mayhem
- Shadowmaker (participação de Erik Canales)
- I Don’t Care (participação de Erik Canales)
- Nothing Else Matters (cover de Metallica)
- Inquisition Symphony (cover de Sepultura)
- Seek and Destroy (cover de Metallica e com pequeno trecho de “Enter Sandman”, da mesma banda)
- Farewell
- Peikko
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