Titãs celebra os 36 anos do clássico “Jesus Não tem Dentes no País dos Banguelas”

Enquanto faz os últimos shows da turnê “Encontro“, que reúne os membros da formação clássica, exceto o saudoso guitarrista Marcelo Fromer, o Titãs comemora 36 anos de “Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas“, o quarto disco da banda, lançado em 23 de novembro de 1987 e tema do nosso papo hoje.

A banda vinha do excelente “Cabeça Dinossauro”, que rompeu fronteiras e deu à banda uma sonoridade mais pesada, se comparada aos primeiros dois álbuns e também à fase atual onde os caras já nem são sombra do que fizeram entre 1986 e 1993. O título do álbum seria uma frase da esposa do baixista Nando Reis, que teria dito que o Brasil era o país dos banguelas.

Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas” tem duas partes, podemos assim dizer. A primeira engloba as cinco primeiras músicas e elas são meio que uma espécie de continuação da faixa “O Quê?”, que fecha o álbum anterior. Muito uso de sintetizadores, deixando as músicas bastante eletrônicas, mas nada que deixe o álbum demasiadamente artificial. Para a produção, novamente veio Liminha e todos se reuniram no Rio de Janeiro, no estúdio Nas Nuvens.

Neste álbum, o baterista Charles Gavin já começava a se destacar por sua performance em seu kit e ele tentou incluir algumas partes mais complexas. Isso pode ser percebido na música “Lugar Nenhum” e em “Violência“, porém, ele meio que foi forçado a tentar ser mais simples na execução de suas partes, pois isso estava gerando um atraso na gravação, já que a todo tempo ele tinha que refazer seus takes. Ele contou recentemente em uma entrevista que isso aconteceu porque como o disco teve atraso por conta do produtor Liminha, que se dividia entre Londres e o Brasil, ele (Gavin) meio que perdeu a mão que estava afiada durante a gravação das demos para esse play. Ele foi obrigado a reduzir seu set, mas ainda assim, apresentou um belo trabalho.

A arte da capa traz oito colinas, que representam cada um dos integrantes da banda e também traz uma foto deles em um cemitério de São Paulo. Tal fato causou a demissão do responsável pelo cemitério, a mandado do então prefeito de São Paulo, Jânio Quadros, em uma atitude arbitrária, que a banda sempre fazia questão de ressaltar quando se apresentava em programas de TV. Para Nando Reis, esse é o melhor trabalho da banda, juntamente com “Tudo ao Mesmo Tempo Agora“. Ele fez tal afirmação recentemente, em seu canal no YouTube.

Eles ficaram em estúdio entre os meses de agosto e outubro de 1987. Antes mesmo de o álbum ser lançado, a música “Lugar Nenhum” foi lançada como single e tornava se sucesso nas rádios especializadas, dando uma amostra dos efeitos que o álbum poderia provocar. Bem, o álbum é curto, então vamos destrinchar cada um das 13 faixas presentes aqui. Quem tem o vinil, não teve acesso a música “Violência“, que não entrou por não caber no vinil, havia restrição de espaço. A faixa entrou na versão em CD, que é a que este redator possui. Vamos então pôr a pequena bolacha no CD player.

O disco começa com a estranha e engraçada “Todo Mundo Quer Amor“, onde Arnaldo Antunes grita algumas palavras, que fazem certo sentido, afinal, todo mundo quer amor, não é mesmo? Exceto os seguidores do dublê de presidente, que vivem do ódio, do preconceito e da disseminação de mentiras. E “Comida” abre de fato o play, com uma pegada eletro, onde as guitarras praticamente não existem, mas ainda assim é uma baita música. E atual. Arnaldo Antunes canta “bebida é água, comida é pasto”… Para bom entendedor, meia palavra basta.

O clima de música eletrônica continua com os sintetizadores sendo utilizados à exaustão em “O Inimigo“, desta vez com performance de Branco Mello que recita a letra. As guitarras começam a aparecer, ainda que dividindo o espaço com os teclados e os sintetizadores em “Corações e Mentes“. Uma boa música e que tocou bastante nas rádios naquele período.

Diversão” é outra faixa excelente onde as guitarras ainda dividem o espaço com os efeitos e sintetizadores e essa é uma das músicas mais brilhantes do disco, na voz de Sérgio Britto, o melhor dos vocalistas do então octeto. A performance do baterista Charles Gavin é outro fator a se destacar. A parte eletrônica chega ao final com a curta Infelizmente, onde o baixo de Nando Reis duela com a bateria eletrônica e o vocal de Sérgio Britto.

A faixa título abre a parte de fato Rock ‘n’ Roll do play em uma música sombria e relativamente pesada, onde Nando Reis entra com o vocal e apenas repete a frase Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas. O teclado ainda é bem presente aqui, mas já temos algo pesado. Uma das músicas mais poderosas da carreira sa banda. “Mentiras” vem na sequência e tem uma levada meio punk, meio pop e é uma das músicas mais interessantes do disco.

Desordem” é outra que faz parte do rol das músicas clássicas do Titãs e com uma letra que permanece atual até hoje. Musicalmente, é um Rock clássico, com alguns momentos pesados. E aqui a combinação guitarra-baixo-bateria e vocal combinam perfeitamente. “Lugar Nenhum” é outro petardo, onde brilha Charles Gavin e sua bateria. A introdução foi inspirada em “Rock and Roll“, do Led Zeppelin e ele vai comandando e dando as direções que Tony Bellotto e Marcello Fromer devem seguir, enquanto Arnaldo Antunes canta as frases com as quais eu me identifico muito: “não sou brasileiro/ não sou estrangeiro/ não sou de nenhum lugar/ sou de lugar nenhum”. Genial.

E a sequência vai só melhorando, com a Punk “Armas Pra Lutar“. Simples com seus três acordes e o vocal se Branco Mello foi perfeito para essa música. O bolsomínion que escutar essa música não deve levar a letra a ferro e fogo, pois os integrantes da banda são todos contrários ao inelegível, que em breve será preso, “talkei”? Perdão, caro leitor, a ironia foi inevitável. “Nome aos Bois” é outra música que além de fazer sentido hoje em dia, é linda, musicalmente e liricamente. Ela cita 34 pessoas de caráter duvidoso, entre eles Emílio Garrastazu Médici, Hitler, Stálin, Delfim Netto, Mengele, Baby Doc, Papa Doc, Pinochet, Gil Gomes, Chapman, Borba Gato, entre outros. E nesta atual turnê, Nando Reis incluiu o nome do ex-dublê de presidente. No play, uma bela performance de Nando Reis e o teclado de Sérgio Britto dá um clima sombrio que a música pede.

Violência” é o bônus track da edição em CD e é uma pena que não tenha havido espaço para entrar no vinil. A música é densa e há uma combinação impressionante dos teclados com as guitarras, sendo que a bateria de Charles Gavin traz a cereja do bolo. O cara estava entrando em uma fase espetacularmente boa. Uma curiosidade aqui é que ao final, Paulo Miklos recita um verso que seria utilizado novamente na faixa “Dissertação do Papa Sobre o Crime Seguida de Orgia“, que seria lanlada no álbum “Titanomaquia” (1993): “O crime é venerado e posto em uso por toda a Terra, de um polo a outro se imolam vidas humanas”. Excelente final.

Temos um belo disco em 37 minutos, que são curtos, mas intensos. O álbum é um dos clássicos do Rock nacional dos anos 1980, quando o estilo estava na crista da onda. Bons tempos quando não tínhamos essas músicas de gosto bastante duvidoso como o funk, pagode, sertanejo e sofrências sendo dominantes. A banda saiu em turnê para divulgar o play e o resultado foi o disco ao vivo “Go Back“, gravado no festival de Montreaux, na França.

Hoje é dia de celebrarmos esse álbum e de botar para tocar no talo. É um disco que envelhece bem e que ajudou a formar o caráter de muita gente: a desse redator que vos escreve e provavelmente a sua tambem, caro leitor. Vamos exaltar essa obra prima enquanto relembramos os tempos que o Titãs fazia Rock de verdade.

Jesus Não tem Dentes no País dos Banguelas – Titãs

Data de lançamento – 23/11/1987

Gravadora – Warner

Faixas:

01 – Todo Mundo Quer Amor

02 – Comida

03 – O Inimigo

04 – Corações e Mentes

05 – Diversão

06 – Infelizmente

07 – Jesus Não Tem Dentes no País dos Banguelas

08 – Mentiras

09 – Desordem

10 – Lugar Nenhum

11 – Armas Pra Lutar

12 – Nome aos Bois

13 – Violência

Formação:

Branco Mello – vocal

Arnaldo Antunes – vocal

Paulo Miklos – vocal

Marcello Fromer – guitarra

Tony Bellotto – guitarra

Nando Reis – baixo/ vocal

Sérgio Britto – teclado/ vocal

Charles Gavin – bateria

Participação especial:

Liminha – percussão em Diversão, baixo/sintetizadores e guitarra em “Comida” violão em “Desordem

Flávio Farias

Fã de Rock desde a infância, cresceu escutando Rock nacional nos anos 1980, depois passou pelo Grunge e Punk Rock na adolescência até descobrir o Heavy Metal já na idade adulta e mergulhar de cabeça na invenção de Tony Iommi. Escreve para sites de Rock desde o ano de 2018 e desde então coleciona uma série de experiências inenarráveis.

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